─ISABELLA!!!
Isabela acordou como se alguém
lhe gritasse o nome. Milhares de sinos tocavam em seus ouvidos machucados e sua
cabeça latejava. Uma senhora estava aos pés da cama com um vestido em mãos
aguardando ela se levantar. Nem perante a senhora tinha coragem de se expor,
estava completamente nua. Envergonhada esticou a mão pedindo o vestido, mas a
senhora não entregou. Depositando a roupa ao lado pegou sugeriu que Isabela a
seguisse.
─ Para onde vamos? Que horas são?
─ perguntou Isabella encabulada.
─ Esses Italianos com sua língua
engraçada ─ resmungou a velha senhora em inglês.
─Para onde vamos? Que horas são? ─
perguntou novamente agora num inglês perfeito.
A mulher olhou-a entre surpresa e
confusa. Mas resolveu responder a questão.
─ A menina decididamente
necessita de um banho antes que Vossa Graça retorne. Ele já mandou avisar que
estará aqui em breve para almoçar com a senhorita, eu ia apenas vesti-la e penteá-la,
mas quando percebi os lençóis, percebi também que precisava de um banho. São
exatos uma e quinze da tarde.
─ Eu preciso de alguém que me
leve embora. Eu necessito voltar pra minha casa. O duque com certeza tem mais
coisas a fazer do que almoçar com uma simples garota como eu e alguém deve
estar me procurando.
─ Deixe de tolice, se ele a
considerasse apenas uma simples garota ele certamente a teria mandado embora
quando saiu. Ele gostou de você menina. Até lhe emprestou uma roupa que
pertenceu á sua mãe. Com certeza será a escolhida dele. Faz tempo que ele não
toma uma amante fixa, mas acho que mudou de idéia com você. Ele vai trazer para
a senhorita muitas jóias e finos perfumes, e vai lhe dar o suficiente para que
mesmo quando ele resolver acabar com o relacionamento você possa ser rica e
viver confortavelmente para sempre. Agora afunde nessa água e lave-se.
Amante.
Aquela palavra soou como uma faca lhe rasgando. O que fizera? Anos e anos
escondida, pra ter um futuro melhor que o de sua mãe e acabara como ela. Primeiro
serviria ao duque. Depois a quem mais? Até acabar sendo uma párea na sociedade.
Onde em determinados lugares não poderia nem passar sem ser motivo de comentários.
Olhou se num espelho de mão que se encontrava numa banqueta ao lado da tina. Era
muito parecida com sua mãe. Talvez por isso Deus tivesse lhe dado o mesmo
destino. Mas não poderia mentir pra si mesma e dizer que estava encantada e
talvez até apaixonada pelo Duque. Desde o instante em que o vira sentira essa
atração. Ele a pedira em casamento, recusara. E agora seria sua amante. Melhor
assim. Iria desaparecer das vistas italianas e futuramente talvez fosse para o
novo mundo. Diziam as línguas boas e más que os americanos eram um povo
tolerante. Uma mudança poderia ser bem-vinda num futuro próximo ou não. Seria a
amante de Albany e depois se aventuraria pelo mundo. Se ele não partisse o seu
coração primeiro.
Humberto olhou para a mesa de
refeições e viu que algo estava errado. Sentiu as mãos tremerem ao tentar levar
mais uma colher da sopa aos lábios. Sentira mesmo um gosto amargo ao provar a
sopa, mas nada que realmente o incomodasse no momento. Respirar se tornara
muito difícil e agora percebia sua visão turva. Estava morrendo, podia sentir
pela espuma saindo de sua boca. Fora infantil em confiar demais em determinadas
pessoas. Alguém gritou e várias pessoas estavam ao redor dele no chão. Quando
foi que caíra? Não estaria vivo para ver Isabella se casar. Não poderia abraça-la
como os pais faziam com suas filhas. Como desejara ser só um rapaz normal,
livre de tantas responsabilidades, ser o pai que Isabella merecia. Liana que
sofrera tanto ao ter a filha e ter que abandona-la. E antes dela, os dois
abortos que a obrigaram a fazer, para que o rei não tivesse ninguém a brigar
pelo seu trono. Liana e Isabella eram as mais prejudicadas, uma por não ter um
pai de verdade, outra por ser o amor da vida de um rei que não poderia amar. Quantas
coisas passavam pela cabeça de um homem à beira da morte. Sentiu ela suspirando
em seu ouvido, talvez Deus trouxesse paz junto à mulher amada em outra vida.
─ Liana.
As últimas palavras do rei antes
de desfalecer. Sem perceber que em torno dele a pergunta feita fora “Quem seria
capaz de atentar contra o rei?”
A rainha mais que exaurida
começou a gritar!!
─ Vocês ouviram, aquela vadia
quis se vingar e o envenenou! Prendam-na eu exijo a cabeça dela em uma bandeja!
O rei não
estava morto. Os médicos estavam tentando de tudo para não deixar que o veneno
tomasse a vida do monarca. A rainha dera as ordens e logo estavam à procura de
Liana. E aquele era somente um carnaval em Veneza...
Isabella sentia-se perdida entre
sonho e realidade. Um pesado anel de safiras em seu dedo anelar esquerdo pra
ela tinham o significado de “fui comprada”. Mas os olhos de Joseph eram uma
tentação que agora seriam seus. Esperava que por um longo tempo.
─ Prometi à sua mãe que a levaria
pra casa às quatro.
Isabella gelou. Jamais poderia
olhar para os tios novamente sem sentir remorso pelo que fizera. Os tios sempre
foram coniventes com suas travessuras mas sempre repudiaram a mãe pelo que ela
era. Não poderia voltar. Não poderia olhar aqueles olhos novamente e verem eles
a desprezarem.
─ Prefiro partir daqui.
─ Partir daqui? Sem voltar pra
casa? ─ Joseph não entendera.
─ Você disse que me levaria à
Londres. Eu falo inglês perfeitamente pode perguntar à sua criada. E eu desejo
ir imediatamente se possível. Afinal já são cinco da tarde mesmo.
─ Percebi o adiantado da hora é
que me atrasei e você estava tão linda me esperando...
─ Quando podemos ir? E já que você
falou com minha mãe, eu gostaria que ela mandasse minhas coisas. Roupas, jóias e
livros, não acho que ela vai se importar em faze-lo.
─ Não quer ver sua família antes
de ir?
─ Sinceramente não acho que eles
queiram me ver após o que aconteceu.
─ Sua mãe me informou que estavam
todos muito preocupados com você.
─ Isso é porque ainda não sabem
que me tornei sua amante. ─ ela não segurou dessa vez, chorou sem pensar. Joseph
a abraçou.
─ É por isso Bella? Eu fui um estúpido
com você minha princesa. Você não será minha amante. Será minha duquesa. E não
estou fazendo isso porque eu a deflorei, nem porque eu estive com sua família e
eles me obrigaram. Estou fazendo isso porque me encantei com seus olhos. Lindos
olhos azuis como safiras. Acho que lhe amo duquesa. Sempre achei que me
apaixonaria por alguém um tanto diferente de você.
─Diferente como? E ainda não sou
sua duquesa, muito menos princesa. Ainda nem aceitei esse pedido de casamento,
alias você pediu?
─Hummm muitas perguntas. Não pedi
porque estou acostumado a dar ordens, e você o aceitou quando coloquei o anel
que foi de minha mãe em seus dedos, ela tinha uma coleção de anéis com pedras
de todas as cores, era a única jóia que usava, portanto meu pai deu a ela vários
anéis, serão todos seus se assim gostar, achei esse ideal pois combina com seus
olhos. Tenho uma atração por mulheres miúdas e loiras. Você é morena e alta
para o padrão londrino, ainda assim é baixa perto de mim. Esses incríveis cabelos
negros estavam escondidos naquela peruca loira quando te vi, e apesar do baile
ter sido de mascaras confesso que gosto mais de você assim na minha cama. Perfeita
e natural. ─ ele a beijou. ─ e se assim preferir posso mandar celebrar nosso
casamento em Londres, algo bem particular. Chamamos seus tios e sua mãe e só.
─Minha mãe jamais iria ao meu
casamento para não me expor como filha da concubina mais falada de toda a
Europa.
─ Mais um motivo para eu fazer um
casamento á portas trancadas. Sua mãe poderia ir. Meus convidados são só
Humberto, meu advogado e meu primo. Mas ele sempre viveu em zona rural e não
reconheceria sua mãe.
─Você faria isso por mim? ─
perguntou ela emocionada
─ Faria por nós dois Bella. Eu não
sou uma pessoa de muitos amigos.
Isabella
foi beijada... uma... duas... perdeu a conta e a cabeça nos braços de seu
duque.
Joseph acordou e viu que era
noite, alguém batia insistentemente na porta de seu quarto. Isabella estava
sentada na cama ao seu lado.
─Cubra-se. É apenas meu criado.
Ela não pensou duas vezes e cobriu-se
até a cabeça.
─Entre. ─ ordenou Albany.
Isabella percebera a diferença no
falar. Era como seus tios. A entonação de voz mudava perante um criado.
─ Desculpe-me atrapalhar Vossa
Graça mas a família da senhorita Isabella está toda reunida em seu salão. Eles
exigem sua presença e a da senhorita também.
Praguejando Joseph se levantou e
começou a se vestir. Isabela fez o mesmo.
─ Continue deitada Bella. Posso resolver
isso sozinho e sem nenhum tipo de constrangimento pra você.
─ Ver você falando assim prova
que não conhece minha família. Tem um roupão pra me emprestar? Creio que você precisa
parar de rasgar minhas roupas ou ficarei sem nenhuma.
Rindo ela se enrolou no roupão
dele que a cobria por completo. Prendeu precariamente o cabelo com alguns
grampos e desceu.
Lorenzo olhou para o casal e teve
a certeza pela primeira vez que Isabella estaria bem. Quando a mensagem de
Liana chegara à sua casa, tivera dúvidas quanto a sanidade mental de sua
cunhada ao dizer que Isabella estava protegida pelo duque. Agora vendo-os, ela
com expressão de felicidade e um pouco receosa de encarar a família e ele
pronto para atacar qualquer um que ousasse recrimina-la, soube exatamente que
sua Bella estava segura.
─Pode ficar tranqüila Bella, pois
não vim para recrimina-la, após receber o recado de Liana que se encontrava
aqui só viemos saber se está bem.─ informou Lorenzo.
Bella saiu detrás do duque e foi
beijar a tia e a prima que também se encontravam no salão.
─Eu havia prometido a Liana que a
levaria pra casa às quatro mas Isabella não quis ir. ─ explicou Albany a
Lorenzo.
─ Dadas as circunstancias eu acho
melhor não mesmo. Isabella corre um grande risco em nossa casa e esse é só mais
um motivo para eu estar aqui.
─Sabe que em menos de uma semana
ela será minha esposa não sabe.
─ Temo que isso não será possível
Albany.
─ Mato pessoalmente qualquer
pessoa que tentar me impedir.
Rindo Lorenzo apertou o ombro do
homem que teria a sorte de levar sua sobrinha ao altar.
─ Calma homem. Como eu disse
dadas as circunstancias, eu e Humberto providenciamos para que isso aconteça
agora. Como você é protestante e Deus me defenda de todos vocês com suas idéias
novas sobre Deus, está vindo aí um bispo para realizar o casamento de vocês ainda
hoje. Não seria adequado minha sobrinha se casar de roupão, portanto gostaria
que ela subisse para se trocar se não se importa.
─ Que circunstancias você está se
referindo?
─Por Deus homem! Você não sabe? Humberto
foi envenenado, não tomou quantidade de veneno suficiente por isso está bem, os
médicos o socorreram a tempo. Mas a rainha acusou Liana e sentenciou sua morte.
Eu fui chamado por Humberto junto com mais dois agentes do serviço secreto para
executarmos algumas missões. Ninguém além de nós e o bispo que estará presente
aqui que Humberto está bem. Hoje as dez da noite temos como dever forjar a
morte de Liana. Esperamos que ela consiga estar aqui para o casamento da filha,
pois depois disso ela irá para a América e não retornará nunca mais a Itália ou
qualquer parte da Europa. O rei suspeita que a rainha o envenenou por ciúmes de
Liana, portanto Isabella corre risco, então forjaremos a morte de Isabella também.
Como a rainha nunca viu o rosto de Isabella, não saberá que a moça morta não é
ela. Já com Liana teremos que cremar o corpo.
─ Por Deus!! Mas que corpos serão
usados para forjar essas coisas?
─ Por sorte é carnaval. Uma
cigana morreu de sífilis e por ser morena diremos a rainha que é Isabella. Um
rapaz quebrou o pescoço ao cair da gôndola bêbado e como ele não tem família
usaremos o corpo dele cremado para dizer que é Liana.
─ Bem acho que tenho que me
vestir adequadamente para meu casamento também não? Isabella já subiu com a
tia.
─ Não sei como o bispo ainda não
chegou já são quinze para as dez.
─ Tão tarde? Pena a cozinheira não
ter preparado um bolo para Bella.
─ Não se preocupe. Maria e Eugênia
passaram em uma confeitaria no caminho e trouxeram um bolo cor de rosa. Acha
que sua cozinheira pode servir mais alguns pratos na ceia?
─ Não
tenho dúvidas. Em Londres costumava voltar do carteado com muitos colegas de
jogo. Era sem aviso e minha cozinheira nunca os deixou sem comida. Avise-a por
favor quantos virão Lorenzo. Sinta-se em casa. Afinal em
poucas horas seremos da família.
Era quase meia noite quando o
bispo terminou de realizar o casamento.
─E pode beijar a noiva! ─
declarou ele.
Isabella sentiu os olhares da família
enquanto Joseph roçava seus lábios de leve. Eugênia havia trazido um vestido
lindo que sua mãe havia mandado fazer a poucos dias e ainda não usara. Era de
um tom prateado com lindas flores vermelhas em seu corpete e um saiote que
parecia mudar de cor quando se mexia. Um véu acetinado tinha sido preso aos
seus cabelos com um diadema de brilhantes. Estava linda. Começou a abraçar a
família até chegar em sua mãe. Vestida como homem e com os cabelos bem curtos
pronta para viajar. Seu tio explicara o que houve e outras explicações foram
dadas. Ao lado de sua mãe o rei de toda a Itália esperava para beijar a noiva. Seu
pai. Imaginara tantas vezes o rosto dele. Todas as vezes que passava um homem
de cabelos escuros na rua de sua casa ficava imaginando se não seria ele o seu
pai. Sem saber que sempre o conhecera e nunca o conhecera realmente. Ele ainda
estava abatido. Beijou-a e desejou sorte a ela e Joseph. Isabella sonhara
diversas vezes com sua vida, com liberdade, com amores. E nunca sonhara com
tanta perfeição como a que via agora na mesa da ceia de seu casamento. Era uma
mulher feliz. Sonhos podiam se tornar reais bastava acreditar...
FIM
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